ZERO HORA 18 de janeiro de 2014 | N° 17677
ENTREVISTA FÁBIO MALINI
Convidado do seminário Conexões Globais fala do futuro das manifestações
Nos dias 24 e 25, Porto Alegre recebe nova edição do seminário Conexões Globais, com debates e encontros sobre cultura digital, sociedade em rede e ativismo online, entre outros temas. Os convidados incluem o articulador do Fora do Eixo, Pablo Capilé, e o fundador da rede Futura.net, Bernardo Gutiérrez e o pesquisador Fábio Malini. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo, Malini é coordenador do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da entidade (Labic) e fala no dia 25, às 16h, na Casa de Cultura, sobre os próximos dos protestos e a evolução política do ativismo online. Ele falou a ZH:
Zero Hora – O que o senhor vai debater no Conexões Globais?
Fabio Malini – Vou levar alguns dados novos sobre os movimentos no Brasil, uma espécie de linha do tempo, que vem de junho até esta semana. Do “Vem pra Rua”, passando pelo 7 de Setembro, os impactos do julgamento do Mensalão, dos rolezinhos, da questão indígena. A primeira abordagem é partir dos dados que coletamos aqui no Labic e formar uma cronologia, quase um gráfico de pulsação dos principais instantes dos movimentos que emergem a partir de junho e que, de certa maneira, prosseguem agora, com o “Não Vai ter Copa”.
ZH – E pelo que o senhor vem mapeando, há como prever uma tendência a curto prazo de como devem se desenvolver esses movimentos?
Malini – Estamos trabalhando com um processo de desenvolvimento de aplicações, tecnologias, scripts, que tenta criar um campo a partir dessa massa gigantesca de dados que estão na internet para produzir previsões a curto prazo. A ideia é que na primeira, segunda semana de abril, essa tecnologia já esteja disponível. Agora, do ponto de vista de uma leitura dos dados sem essas tecnologias, me parece que hoje toda mobilização social é de rede, e é impossível dissociá-la disso. isso gera um desencaixe com formas tradicionais de movimentação.
ZH – Qual é essa dissonância?
Malini – A característica dos movimentos de hoje é que eles funcionam um pouco como um aplicativo de celular. Você baixa e ele é atualizado de tempo em tempo. E o que estamos vendo desde junho é um movimento que se atualiza. Ele não passa pelo processo de refluxo, como dizia a teoria dos movimentos sociais tradicional. Ele sofre um processo de atualização: acontece, chega ao ápice, decai, passa por um novo processo de desenvolvimento, que em minha avaliação ocorreu ali por outubro, novembro e dezembro, e agora está se atualizando em outro formato, que passa pelo “Não Vai Ter Copa”, pelo S.O.S. Maranhão... Ele incorpora novos sujeitos, refina determinadas demandas, inclui outras. Estamos, então, vivendo uma espécie de movimento que se pode chamar de “beta-permanente”, em permanente construção. E, em geral, quem governa, por ter sido formado em um movimento político e social que flui e depois reflui, acontece e depois some, não consegue entender bem essa ideia de algo que acontece e se atualiza. Então, na verdade, quando um movimento em rede acontece, esse acontecimento é a última etapa da atualização, não a primeira. O “Não Vai Ter Copa” já estava se constituindo nas redes, e agora vamos vê-lo se atualizando nas ruas. O Rolezinho já acontecia, agora vai se atualizar. Esse é um fluxo contínuo, permanente, de desenvolvimento de direitos. Os novos direitos cada vez mais vão assumir uma dinâmica que articula demanda social, mobilização em rede e atualização desses direitos. A rua se torna o lugar em que esses movimentos se tornam visíveis.
ZH – O movimento ainda está por aí, mas demandas originais parecem ter sumido da pauta, como Pinheirinho, Amarildo ou os Guarani Kaiowá.
Malini – Essa é uma pergunta que em geral é muito comum. Porque tem nela uma certa dúvida que precisa ser discutida, a da efemeridade das pautas. Mas será que essas pautas são mesmo efêmeras? Acredito que não. “Onde Está o Amarildo” possibilitou trazer para o debate político algo que não estava em junho, que é a violência policial, e isso desencadeou, por exemplo, o projeto de lei de desmilitarização que está no Senado; o fim da proibição do funk nas favelas cariocas; a prisão de policiais envolvidos na morte do Amarildo; a discussão sobre as UPPs. Ou seja, o fato de mudar a mentalidade política da gente é um grande avanço. Colocar na agenda política esse tema, e não “como fazer um grande evento”, é uma grande curva que se faz. Tem tanto medidas práticas quanto políticas. Hoje o país está discutindo muito pela rede. As timelines das redes sociais antes discutiam pouca política, e hoje a discussão é o tempo inteiro. E você tem outros temas. A questão da mobilidade urbana: como os governos adotaram essa agenda? Pressionados pelo Movimento Passe Livre. O direito de minorias é outro campo que trouxe bastante questões. Era um tema que em 2013 não estava tão focado, e agora está na pauta dos candidatos. Essa é a importância de uma sociedade civil atuante e que não é articulada ou alinhada com os governos.
POR CARLOS ANDRÉ MOREIRA
ENTREVISTA FÁBIO MALINI
Convidado do seminário Conexões Globais fala do futuro das manifestações
Nos dias 24 e 25, Porto Alegre recebe nova edição do seminário Conexões Globais, com debates e encontros sobre cultura digital, sociedade em rede e ativismo online, entre outros temas. Os convidados incluem o articulador do Fora do Eixo, Pablo Capilé, e o fundador da rede Futura.net, Bernardo Gutiérrez e o pesquisador Fábio Malini. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo, Malini é coordenador do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da entidade (Labic) e fala no dia 25, às 16h, na Casa de Cultura, sobre os próximos dos protestos e a evolução política do ativismo online. Ele falou a ZH:
Zero Hora – O que o senhor vai debater no Conexões Globais?
Fabio Malini – Vou levar alguns dados novos sobre os movimentos no Brasil, uma espécie de linha do tempo, que vem de junho até esta semana. Do “Vem pra Rua”, passando pelo 7 de Setembro, os impactos do julgamento do Mensalão, dos rolezinhos, da questão indígena. A primeira abordagem é partir dos dados que coletamos aqui no Labic e formar uma cronologia, quase um gráfico de pulsação dos principais instantes dos movimentos que emergem a partir de junho e que, de certa maneira, prosseguem agora, com o “Não Vai ter Copa”.
ZH – E pelo que o senhor vem mapeando, há como prever uma tendência a curto prazo de como devem se desenvolver esses movimentos?
Malini – Estamos trabalhando com um processo de desenvolvimento de aplicações, tecnologias, scripts, que tenta criar um campo a partir dessa massa gigantesca de dados que estão na internet para produzir previsões a curto prazo. A ideia é que na primeira, segunda semana de abril, essa tecnologia já esteja disponível. Agora, do ponto de vista de uma leitura dos dados sem essas tecnologias, me parece que hoje toda mobilização social é de rede, e é impossível dissociá-la disso. isso gera um desencaixe com formas tradicionais de movimentação.
ZH – Qual é essa dissonância?
Malini – A característica dos movimentos de hoje é que eles funcionam um pouco como um aplicativo de celular. Você baixa e ele é atualizado de tempo em tempo. E o que estamos vendo desde junho é um movimento que se atualiza. Ele não passa pelo processo de refluxo, como dizia a teoria dos movimentos sociais tradicional. Ele sofre um processo de atualização: acontece, chega ao ápice, decai, passa por um novo processo de desenvolvimento, que em minha avaliação ocorreu ali por outubro, novembro e dezembro, e agora está se atualizando em outro formato, que passa pelo “Não Vai Ter Copa”, pelo S.O.S. Maranhão... Ele incorpora novos sujeitos, refina determinadas demandas, inclui outras. Estamos, então, vivendo uma espécie de movimento que se pode chamar de “beta-permanente”, em permanente construção. E, em geral, quem governa, por ter sido formado em um movimento político e social que flui e depois reflui, acontece e depois some, não consegue entender bem essa ideia de algo que acontece e se atualiza. Então, na verdade, quando um movimento em rede acontece, esse acontecimento é a última etapa da atualização, não a primeira. O “Não Vai Ter Copa” já estava se constituindo nas redes, e agora vamos vê-lo se atualizando nas ruas. O Rolezinho já acontecia, agora vai se atualizar. Esse é um fluxo contínuo, permanente, de desenvolvimento de direitos. Os novos direitos cada vez mais vão assumir uma dinâmica que articula demanda social, mobilização em rede e atualização desses direitos. A rua se torna o lugar em que esses movimentos se tornam visíveis.
ZH – O movimento ainda está por aí, mas demandas originais parecem ter sumido da pauta, como Pinheirinho, Amarildo ou os Guarani Kaiowá.
Malini – Essa é uma pergunta que em geral é muito comum. Porque tem nela uma certa dúvida que precisa ser discutida, a da efemeridade das pautas. Mas será que essas pautas são mesmo efêmeras? Acredito que não. “Onde Está o Amarildo” possibilitou trazer para o debate político algo que não estava em junho, que é a violência policial, e isso desencadeou, por exemplo, o projeto de lei de desmilitarização que está no Senado; o fim da proibição do funk nas favelas cariocas; a prisão de policiais envolvidos na morte do Amarildo; a discussão sobre as UPPs. Ou seja, o fato de mudar a mentalidade política da gente é um grande avanço. Colocar na agenda política esse tema, e não “como fazer um grande evento”, é uma grande curva que se faz. Tem tanto medidas práticas quanto políticas. Hoje o país está discutindo muito pela rede. As timelines das redes sociais antes discutiam pouca política, e hoje a discussão é o tempo inteiro. E você tem outros temas. A questão da mobilidade urbana: como os governos adotaram essa agenda? Pressionados pelo Movimento Passe Livre. O direito de minorias é outro campo que trouxe bastante questões. Era um tema que em 2013 não estava tão focado, e agora está na pauta dos candidatos. Essa é a importância de uma sociedade civil atuante e que não é articulada ou alinhada com os governos.
POR CARLOS ANDRÉ MOREIRA
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