A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

domingo, 3 de março de 2013

O PALHAÇO BLOGUEIRO


ZERO HORA 03 de março de 2013 | N° 17360 ARTIGOS


Luiz Antônio Araujo*


Aconteceu na Itália há apenas uma semana: um movimento organizado há pouco mais de três anos, sem plataforma política e sem sede, liderado por um ex-comediante e que teve um blog na internet como principal ferramenta de campanha obteve 8,7 milhões de votos na eleição parlamentar.

No Brasil, esse total equivaleria a mais de 20 milhões de votos, superiores à votação de Marina Silva no primeiro turno da eleição presidencial de 2010. Vale lembrar que Marina era uma personalidade internacionalmente reconhecida quando decidiu concorrer à Presidência. Do ponto de vista dos efeitos políticos, a diferença é que, pelo sistema presidencialista brasileiro, os 19,6 milhões de votos de Marina resultaram em uma observação na ata da Justiça Eleitoral: “Não eleita”. No sistema italiano, parlamentarista, os 8,7 milhões de votos elegeram a maior bancada partidária na Câmara e quase um quinto do Senado.

O Movimento Cinco Estrelas (ou M5S, sigla em italiano que toma emprestada a grafia usada nas redes sociais) tornou-se a terceira força política da Itália, capaz de se tornar o fiel da balança na formação de um futuro governo. Até o momento, o grupo recusou a aproximação com qualquer uma das forças no parlamento, criando um impasse que pode levar à convocação de novas eleições.

Criador do M5S, Beppe Grillo é um cômico politizado pela crise do euro. Num ambiente marcado pela indignação, especialmente entre a juventude, ele reserva um tratamento agressivo aos políticos tradicionais, num tom a meio caminho entre a sátira e a demagogia. Esculhamba o ex-comunista Luigi Bersani (“está fora da história e não se deu conta”), o direitista Silvio Berlusconi (“cadáver ambulante”) e o atual primeiro-ministro, Mario Monti (“Rigor Mortis”, referência à postura rígida). Chama os partidos de “câncer da democracia”. Durante a campanha, propôs uma reforma do sistema eleitoral, com adoção da representação proporcional direta, estímulo à geração limpa de energia e internet para todos. O verdadeiramente escandaloso, para os observadores europeus, é seu intento de convocar um plebiscito para decidir sobre a permanência da Itália no bloco econômico europeu.

Artistas e comediantes tornaram-se fenômenos midiáticos no passado ao disputar – às vezes, com algum sucesso – cargos eleitorais na Europa. Agora, imagine Coluche, o humorista francês, levando até o fim a ideia de se candidatar à presidência da França em 1980 e obtendo os 16% de votos que lhe eram atribuídos por algumas pesquisas. Ou Cicciolina, atriz pornô italiana que chegou a se eleger deputada, liderando a maior bancada da Câmara.

O que há de verdadeiramente novo no M5S é o fato de que, pela primeira vez numa eleição europeia, um movimento organizado via internet obtém um resultado capaz de desequilibrar o balanço de poder. O logotipo do M5S reproduz o endereço eletrônico do blog de Grillo (). O blog, por sua vez, contém um pedido de doações eletrônicas para o movimento, com o objetivo de arrecadar 1 milhão de euros. Antes da eleição, a revista Forbes chegou a considerar Grillo o sétimo blogueiro mais importante do mundo. Seus partidários, em sua maioria jovens – uma das deputadas eleitas pelo movimento tem 25 anos –, foram apelidados pela imprensa de grillini (grilinhos).

Para quem vê no grilismo uma nuvem passageira, a eleição para a prefeitura de Parma, em abril do ano passado, serve de alerta. Nessa rica cidade de 188 mil habitantes, tradicionalmente governada pela direita, o M5S obteve sua primeira vitória eleitoral expressiva. A administração local foi tomada pela patuleia – uma horda de professores, donas de casa, estudantes, funcionários públicos e desempregados cuja experiência administrativa não vai muito além de equilibrar o orçamento doméstico.

*JORNALISTA

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