A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

O DESAFIO DE SER REPRESENTADO

ZERO HORA 27 de junho de 2013 | N° 17474

COMOFAZ 7


A maioria das pessoas reclama da falta de sintonia entre eleitores e parlamentares. A reclamação das ruas deu urgência à reforma política. Especialistas avaliam que os partidos continuarão existindo, porém é necessário ampliar os canais de participação popular.

Nas últimas semanas, as ruas do país tornaram-se um ambiente hostil para militantes partidários. Da direita à esquerda, sem distinção. Na onda de protestos que impacta o Brasil, bandeiras de siglas chegaram a ser rasgadas e queimadas, sob gritos de “sem partido, sem partido”. Cenário inimaginável algumas décadas atrás, quando legendas lideravam manifestações populares. Apesar do descontentamento escancarado nos atos, cientistas políticos são unânimes: não há democracia sem partidos. Em geral, eles defendem urgência na reforma do sistema político, para que o mesmo possa ser aprimorado.

Nos poderes Legislativo e Judiciário, o coro das ruas ganhou apoio. Na terça-feira, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, disse que é preciso “mitigar o peso dos partidos”. Já o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) comprou briga, na semana passada, ao afirmar que todas as siglas deveriam ser abolidas, por uma razão muito simples: “os partidos fracassaram”. No entanto, o pedetista limitou-se a sugerir que se “trabalhe para saber o que pôr no lugar”.

Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Luis Gustavo Grohmann avalia que a medida é incabível:

– Tu podes propor o fim do monopólio dos partidos sobre a representação, a ampliação dos canais de participação. Se quiseres descartar partidos, começa a se criar um regime autoritário e não democrático.

Grohmann pondera que a sociedade precisa encontrar formas de organização – de participação e de proposição política, algo que, conforme o especialista, é o que os manifestantes estão tentando fazer.

Para Fernando Schüler, cientista político e diretor-geral do Ibmec/RJ, a crise de representatividade não é recente. A novidade, diz, é o modelo de articulação impulsionado pelas redes sociais e independente da mediação de instituições políticas tradicionais.

– Estamos na era dos indivíduos, que assumem o protagonismo. É um movimento global que veio para ficar. A democracia representativa terá de incorporar formas de representação que a tecnologia colocou na ordem do dia – diz Schüler.

Na avaliação de Ricardo Caldas, diretor do Centro de Estudos Avançados na Universidade de Brasília, as pessoas não se sentem representadas porque “os partidos estão mais voltados para fazer negócio no governo federal, com indicações que irão virar verba de campanha do que em fazer contato com os eleitores”. A reforma política, ressalta, seria a única maneira de mudar este cenário. Uma das alternativas sugeridas é a adoção do voto distrital, que tornaria as campanhas mais baratas e aproximaria o político de quem o elegeu.

Schüler alerta, entretanto, que o debate sobre o tema não deve ser feito em tom emocional, como resposta a uma crise conjuntural. Conforme o professor, o ideal é que o plebiscito sugerido pela presidente Dilma Rousseff – ou o referendo, que surge como possibilidade – seja realizado no ano que vem, depois das eleições.

Se não restam dúvidas a respeito da crise, pairam pontos de interrogação sobre o futuro. Ex-deputado estadual e federal, o jornalista e sociólogo Marcos Rolim, há cinco anos sem filiação partidária, afirma que o descrédito dos partidos demonstra que o atual modelo político está falido.

– Esse movimento assina o atestado de óbito do nosso modelo político. Se isso vai implicar mudanças profundas? Ninguém sabe. Mas acho que o Brasil não vai ser mais o mesmo.

CLEIDI PEREIRA



Políticos se acusam


No Rio Grande do Sul, lideranças da situação e da oposição reconhecem que a política está desmoralizada. Mas a concordância para por aí. Para o presidente estadual do PT, Raul Pont, a crise de legitimidade é crescente e não foi descoberta pelos manifestantes. Segundo Pont, a reforma política é uma luta de anos do partido, que, no entanto, ainda não obteve quórum para votar.

– A maioria dos partidos quer manter essa situação – avalia.

Embora admita que a política “vem dando demonstrações de incompetência”, o presidente do PSDB no Rio Grande do Sul, Adilson Troca, afirma que as manifestações refletem, acima de tudo, o descontentamento da população com o atual governo.

– A oposição não teve eco diante da grande estrutura do governo – diz Troca, defendendo que a reflexão se estenda por todos os poderes, porque “cada um vai ter que fazer a sua parte”.

Desde terça-feira, ZH está analisando as principais reivindicações expressas nos cartazes dos manifestantes. Confira todas as reportagens da série em zhora.co/comofaz2706



RESPOSTA RÁPIDA

1. Fazer a reforma política, considerada medida prioritária. Projeto que trata do assunto se arrasta há mais de 15 anos no Congresso. Para tirar a proposta do papel, a presidente Dilma Rousseff sugeriu a realização de plebiscito. Especialistas apontam que melhor opção seria o referendo. No plebiscito, o eleitor dá poder ao parlamentar para fazer mudanças sobre o tema. No referendo, o eleitor aceita ou não as modificações aprovadas pelos congressistas. A revisão pode contribuir para tornar campanhas mais baratas e aproximar os eleitos dos eleitores, por meio do voto distrital, por exemplo. Tornar viável candidaturas avulsas (sem filiação partidária) contemplaria outro pleito dos manifestantes.

2. Ampliar e criar canais de participação para que as demandas da sociedade sejam ouvidas. Plebiscito e referendo mecanismos previstos em lei para que a população delibere sobre matérias relevantes são pouco utilizados atualmente. O último plebiscito feito no Brasil ocorreu em dezembro de 2011 e envolveu os eleitores no Pará, consultados sobre a divisão do Estado.

3. Partidos políticos avaliam rever suas bandeiras, projetos e formas de atuação.

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