EDITORIAIS
Ao propor um plebiscito sobre a convocação de Constituinte exclusiva para promover uma reforma política capaz de atender ao principal anseio das manifestações de rua um sistema representativo digno, políticos honestos, combate efetivo à corrupção e à impunidade, controle de gastos públicos, serviços públicos eficientes (especialmente de saúde, educação e segurança) , a presidente Dilma Rousseff procurou dar uma resposta diferenciada para a insatisfação popular com tudo isso que está aí, como argumentam os manifestantes. Porém, a proposta presidencial provocou imediata e compreensível reação de segmentos comprometidos com a democracia, especialmente de juristas e constitucionalistas, pois abre caminho para mexer na Constituição sem uma ruptura constitucional que justifique isso, além de acender o ranço golpista empregado por governantes que se encastelaram no poder em países como a Venezuela. Diante de tais riscos, o projeto precisa ser repensado. Integrantes do governo já admitem rever a proposta, depois de reu-niões com representantes da OAB e de ouvir a opinião de integrantes do Judiciário.
Porém, dois pontos desse debate precisam ser imediatamente evidenciados. O primeiro é a adequada tentativa da presidente da República em dar respostas imediatas e não convencionais para o clamor incessante das ruas, que realmente exige urgência e criatividade. O segundo é a inevitável interpretação de que nem ela – assim como os jovens e grande parte da sociedade – confia nos atuais congressistas para promover as mudanças de que o país necessita. Aliás, a população também desconfia de um Executivo que tem se mostrado inoperante em relação à economia e conivente com conchavos políticos, como evidenciam os quase 40 ministérios aparelhados por aliados partidários.
Nada indica que os manifestantes que tomaram as ruas do país nas últimas duas semanas queiram mudar o sistema de governo ou alterar a democracia representativa. O que eles querem é gente honesta no exercício da administração pública. É isso, também, o que a maioria dos brasileiros deseja. Mais do que uma reforma política, precisamos de uma reforma moral, uma reforma na mentalidade dos governantes, dos representantes parlamentares e dos homens públicos em geral, para que efetivamente trabalhem pelo Brasil. Sem isso, também não terá efeito a ideia de transformar a corrupção em crime hediondo, até porque todos sabemos que a impunidade continua sendo a regra geral no país.
Só que ninguém pode se iludir com os protestos, achando que o país sofrerá uma transformação cultural do dia para a noite. Mas também é inadmissível que o sistema apontado como enferrujado e corrompido resista intocado a esta onda de descontentamento. Por isso, é impositivo que alternativas como a proposta pela presidente, e outras que estão sendo aventadas por governadores e prefeitos, sejam efetivamente discutidas. Descarte-se o que não servir, mas não se deixe de buscar respostas para o clamor social. O Congresso, mesmo com todos os seus vícios, também encontra o caminho certo quando se sente pressionado. Vale lembrar, por exemplo, a aprovação das leis de Responsabilidade Fiscal, de Acesso à Informação Pública e da Ficha Limpa, que inclusive se originou de iniciativa popular. O mínimo que os deputados e senadores deveriam fazer, neste momento de inquietação, era estabelecer uma agenda propositiva para cumprir ainda este ano, com resposta para as demandas sociais.
Com plebiscito ou sem plebiscito, com Constituinte ou sem ela, a reforma política já entrou novamente na pauta do país porque é uma imposição da sociedade.
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