PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA
Ao final da tarde de hoje, milhares de pessoas exercerão nas ruas do Brasil o sagrado direito de protestar. Serão bem-vindos os cartazes, as faixas, os slogans, as bandeiras, as críticas, os gritos e tudo o que possa ser classificado como manifestação pacífica.
Quem descobriu a beleza de soltar a voz e participar deste que está sendo considerado um momento histórico não pode compactuar com os vândalos que pelo Brasil afora se aproveitam da concentração para depredar prédios públicos e privados, quebrar carros, incendiar ônibus, destruir contêineres de lixo e saquear lojas. Mesmo sendo praticados por uma minoria radical, os excessos registrados até agora são preocupantes, porque não combina com o espírito dos jovens que trocaram o conforto do sofá pelas ruas.
Quem justifica o vandalismo com o argumento de que é uma forma de extravasar a indignação acumulada ao longo de anos com a falta de hospitais, a má qualidade do transporte coletivo ou o aumento do custo de vida, não entendeu que a simpatia conquistada nas últimas semanas pode ir pelo ralo se o movimento partir para a violência.
As cenas vistas ontem, na ponte Rio-Niterói, no Rio de Janeiro, são assustadoras, como foram as registradas na véspera em São Paulo, na tentativa de invasão da prefeitura. São essas cenas que correm o mundo e semeiam desconfiança em relação à estabilidade política do Brasil, com reflexos imediatos na economia, com queda nas bolsas, desvalorização da moeda e risco de aumento da inflação. Que investidor nacional ou estrangeiro vai apostar em um país convulsionado?
O Brasil, diferentemente da maioria dos países europeus, não enfrenta maiores problemas de desemprego, mas poderá enfrentá-los se as empresas começarem a reduzir investimentos por conta da crise.
Há uma tremenda ingenuidade na crença de que a pressão popular pode tudo. A crise na Espanha e em Portugal que, diante do caos econômico, as manifestações de rua não são capazes de produzir empregos nem de gerar renda. Os problemas do Brasil são imensos, mas podem piorar se os protestos evoluírem para o quebra-quebra.
Cautela no TJ e na Assembleia
Por conta dos protestos previstos para hoje, o expediente na Assembleia Legislativa e no Tribunal de Justiça será encerrado às 16h.
A Assembleia cancelou também a sessão comemorativa aos 20 anos do Sarau do Solar, marcada para as 18h30min.
O espetáculo consta da programação do Segundo Caderno de ZH, que já estava impresso quando a suspensão foi decidida pela direção da Assembleia.
ALIÁS
Mais do que a redução do preço das passagens, os protestos devem servir para abrir a caixa-preta das empresas de ônibus e dar visibilidade às planilhas de custo. O Tribunal de Contas já mostrou que havia fragilidades.
NO MESMO BARCO
No início da onda de protestos contra o aumento das tarifas de transporte público, a revogação do reajuste foi classificada como “impossível” pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e pelo prefeito da capital paulista, Fernando Haddad (PT).
Ontem, sufocados pela pressão popular, o tucano e o petista se uniram para anunciar que voltaram atrás: a passagem de ônibus e metrô será, novamente, de R$ 3, e não R$ 3,20.
Alckmin explicou que a revogação implicará corte de investimentos.
– As empresas não suportam. O Tesouro paulista terá de arcar com esses custos.
Haddad também fez coro ao discurso do tucano e pediu que seja aberta discussão “sobre as consequências dessa decisão que foi tomada”.
A exemplo de São Paulo, o Rio de Janeiro também revogou o reajuste na capital, de R$ 2,95 para R$ 2,75. Ao contrário de Alckmin e Haddad, que preferiram lamentar a necessidade de reduzir investimentos, o prefeito Eduardo Paes (PMDB) tentou capitalizar politicamente o ato:
– É uma forma de mostrar respeito às pessoas que foram às ruas protestar.
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