A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

MILHARES SOB CHUVA E FRIO EM PORTO ALEGRE


ZERO HORA. 21 de junho de 2013 | N° 17468

A garoa que teimou em cair debaixo de uma temperatura de 14°C não foi suficiente para tirar o ânimo de milhares de pessoas que foram às ruas de Porto Alegre ontem à noite.

ITAMAR MELO

Às 17h30min, debaixo de uma chuva forte e insistente, uma multidão espremia-se diante da prefeitura, pelo Largo Glênio Peres, na Avenida Borges de Medeiros e em ruas vizinhas. Do meio da multidão, alguns objetos foram arremessados sobre os guardas municipais que, detrás de um cordão de isolamento, protegiam a sede da administração de Porto Alegre.

A massa rugiu imediatamente:

– Sem violência! Sem violência! Sem vandalismo! Sem vandalismo!

Dois ou três manifestantes atravessaram o cordão, subiram a escadaria da prefeitura e, abaixados sob os pés dos guardas, recolheram os objetos atirados. Receberam uma ovação como recompensa.

Para quase todos que estavam ali, tratava-se de construir um país melhor de forma pacífica – com transporte público barato e de qualidade, sem corrupção e sem desperdício do dinheiro público. Sob o aguaceiro, ecoaram na praça palavras de ordem contra os gastos com obras da Copa e contra projetos em tramitação no Congresso, como o da “cura gay”.

– Até o Papa renunciou. Feliciano, a tua hora já chegou – ouviu-se.

Policiais militares circulavam entre as pessoas, pedindo paz e entregando folhetos dirigidos aos “prezados manifestantes”. De tempos em tempos, a massa combatia o frio de 14°C pulando em sincronia e cantando:

– Quem não pula quer aumento!

Uma turma escolheu a habitação como tema e pediu à prefeitura que “devolvesse nossas casas”. Houve quem tenha respondido a uma pesquisa do Ibope, já que 12 profissionais identificados saíram às ruas para colher a opinião de 200 manifestantes. Em mais de 50 perguntas, o instituto queria saber a opinião sobre o protesto.

– Baixa a bandeira! O povo, unido, não precisa de partido! – gritava a multidão encharcada, sempre que via tremular o estandarte de alguma agremiação política.

Às 18h, a massa virou as costas para a prefeitura, pronta para iniciar sua marcha pela cidade. Mas ninguém saiu do lugar durante meia hora. Diferentes grupos tentavam assumir a liderança do protesto e ditar o roteiro. Uma ala queria fazer a multidão subir a Borges de Medeiros. Outra, tentava seguir pela Avenida Júlio de Castilhos.

No final, a multidão dividiu-se em duas, cada uma seguindo para um lado da Borges. Vendo que havia a bandeira de um partido puxando a caminhada para um dos lados, muitos optaram pelo sentido oposto.

– Volta! Volta! Atrás de partido não! – reclamaram.

O grupo mais numeroso, com milhares de pessoas, seguiu pela Júlio de Castilhos. Notava-se o esforço que uma turma organizada fazia para tomar a frente da marcha e direcioná-la. Parando a caminhada várias vezes, dando instruções a quem vinha atrás e trocando informações por telefone, esse grupo dirigiu a multidão até o túnel da Conceição. Na chegada à Osvaldo Aranha, direcionou a massa para a Avenida João Pessoa.

– Quando o pessoal chegar à João Pessoa, virem à direita e entrem na Salgado Filho – orientava, por celular, um ativista que tentava controlar o protesto, levando-o de volta ao Centro.

Na passagem pela Santa Casa, brotou uma demonstração de respeito. Antes ruidosa, a manifestação transcorreu em quase absoluto silêncio, em respeito aos doentes internados na instituição. Um ou outro gaiato se arriscou a gritar para quem estava nas janelas dos prédios, pedindo que saíssem à rua. A repreensão veio em uníssono:

– Sssshhhhh!!!!

Quando os manifestantes chegaram à João Pessoa encontraram, vindo em sentido contrário, outro grupo de participantes do protesto. Em lugar de ir para o Centro, eles vinham do Centro, puxados para a Avenida Ipiranga. Ali viu-se, durante cerca de 15 minutos, um embate entre os grupos que tentavam liderar o protesto.

– Pela Salgado! Pela Salgado! É Palácio Piratini! Piratini! – gritavam alguns.

Preferência pelo caminho pacífico

Os partidários de protestar na sede do governo chegaram a fazer uma parede humana e a pedir a quem descia a João Pessoa que voltasse.

– Por aí não! Eles acham que a gente é burro. Não vamos atrás da direita! É Piratini.

– É sabotagem! – diziam outros.

Os participantes do protesto ficaram confusos, sem saber o que fazer.

– Para lá ou para cá? – perguntou um rapaz.

– Depende. Qual é mais pacífico? – respondeu a garota que o acompanhava.

– Sem violência! Sem violência! – gritavam.

No final, com milhares de pessoas já na altura do Parque Farroupilha, a multidão pendeu para o rumo da Ipiranga.

– Vamos para lá, então. Já fomos e voltamos três vezes – decidiu um rapaz.

Do alto do viaduto, dava para ver que havia muita gente. Pelo menos 20 mil, segundo estimativa da Brigada Militar.

– Imagina se não fosse a chuva e a logística que montaram para esvaziar o Centro. Dez por cento da cidade estaria aqui – avaliou um rapaz.

Até então, estava tudo tranquilo. Os problemas só começaram às 20h, na esquina das avenidas João Pessoa e Ipiranga, quando cerca de cem manifestantes entraram em confronto com a tropa de choque da Brigada Militar.





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