A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

sábado, 22 de junho de 2013

SOBRAM RAZÕES



ZERO HORA 22 de junho de 2013 | N° 17469

Lícia Peres*


Cada dia reserva surpresas. Refiro-me às manifestações que vêm ocupando as praças e ruas de nosso país.

De repente, uma população, majoritariamente de jovens, mas também incluindo pessoas de outras faixas etárias, levanta cartazes expressando variadas inconformidades, aquilo que mais, individualmente, lhes indigna. Reivindicam menores tarifas para o transporte público, exigem o fim da corrupção, mais verbas para saúde e educação, o fim da impunidade e muito mais. Inexiste um eixo comum.

Acrescente-se a condenação aos gastos para viabilizar os jogos da Copa. Fizeram contas e deixaram claro que os vultosos recursos deveriam ser direcionados para áreas essenciais. Desejam o pão, mas dispensam o circo.

Sem lideranças de qualquer origem, conectados às redes da internet, vão à cena pública.

Eu, que pertenço a uma geração que foi às ruas contra a ditadura e pelas Diretas Já; que presenciou o Fora Collor, não esperava manifestações desta magnitude. As novas gerações estão dispensando a acomodação e, maciçamente, sem hierarquia, fazendo-se ouvir. Infelizmente algumas reivindicações para mim tão importantes não estão ainda dando as caras nesses movimentos: a condenação à violência contra a mulher, o repúdio à Bolsa Estupro, aberração que busca retirar o direito à interrupção até da gravidez resultante de violência sexual; ou seja, acabar com o pouco que temos. Sonho com grandes faixas reivindicando a legalização do aborto. Esse sonho foi realizado na Itália, que sedia o Vaticano, quando, em 1979, 1 milhão de mulheres nas ruas conquistaram esse direito. Quando lá estive em 1980, a vibração era indescritível.

Algo deve ser creditado ao pastor Marco Feliciano. Sua eleição para a presidência da Comissão dos Direitos Humanos foi tão repulsiva, que deu início a sucessivas mobilizações. Foi o elemento desencadeador, o início. Aquele que preconiza a “cura gay”, que sataniza os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, acendeu o estopim.

Os exageros decorrentes da falta de espírito público de uns poucos participantes, os depredadores, os incendiários, os que vão longe demais e perdem a noção da importância do momento atual e do seu protagonismo, vão de encontro ao desejo da imensa maioria que quer um Brasil livre de corrupção, superando o atraso da política nacional. Apostam na esperança. Já podem ser contabilizadas algumas vitórias: o adiamento da votação da PEC 37, que pretende retirar do Ministério Público a atribuição de investigar, a revisão das tarifas do transporte público.

De fato, não há um motivo para tamanha revolta. Sobram razões.

*SOCIÓLOGA

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