A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

sábado, 15 de junho de 2013

VIOLÊNCIA CONDENADA

ZERO HORA 15 de junho de 2013 | N° 17463

LIMITE DOS PROTESTOS

Os protestos contra a elevação da tarifa de ônibus tiveram início na Capital em março, se alastraram por diversas capitais do país e retornaram com voltagem redobrada para Porto Alegre nesta semana. A escalada no nível de agressividade de manifestantes e policiais reforça um debate sobre os limites das ações de cada parte e o temor de novos confrontos.


Ao ampliar o número de alvos e o nível dos danos registrados, o mais recente protesto contra a tarifa de ônibus em Porto Alegre inflamou um debate sobre a violência nas manifestações e o papel de ativistas e policiais. Reproduzida com fôlego nas redes sociais, a discussão apresenta pontos de vista divergentes sobre o rumo da mobilização, mas encontra um ponto comum: o temor de acirramento dos ânimos.

Zero Hora ouviu líderes políticos, sociólogos, manifestantes e cidadãos de diferentes matizes ideológicos sobre a elevação na agressividade dos protestos. Foram contabilizadas depredações ao patrimônio público e privado. Em contrapartida, a Brigada Militar deteve 23 suspeitos. Um vídeo publicado na internet mostra que policiais recolheram pessoas até de dentro de um bar. Não houve, porém, relatos de agressões como as praticadas pela PM paulista.

Até esta semana, os alvos costumavam ser prédios relacionados à questão da tarifa de ônibus, como a prefeitura.

– A população está ficando mais indignada com o aumento do custo de vida, com a corrupção e a falta de democracia nas discussões sobre as cidades, além da forte repressão que houve em São Paulo – argumenta a vereadora do PSOL Fernanda Melchionna.

O protesto de quinta na Capital sucedeu a manifestações em São Paulo, por sua vez inspiradas no movimento porto-alegrense, que envolveram duros confrontos entre ativistas e policiais. Fernanda sustenta que dar destaque a atos radicais promovidos por uma minoria é uma tentativa de criminalizar o movimento na Capital. Para o líder do PSDB na Câmara de Vereadores, Mario Manfro, as depredações devem ser vistas, sim, como parte das manifestações e combatidas com rigor pela polícia.

– Se tu chamas um manifesto, tu és responsável pelo bônus se conseguir a tua meta. Mas também é responsável pelo ônus se as coisas fogem do controle – sustenta Manfro, que também condena os bloqueios de vias públicas.

O cientista político e coordenador do curso de Ciências Sociais da Ulbra, Paulo Moura, avalia que o vandalismo é promovido por pessoas que procuram ampliar a visibilidade das ações aproveitando-se de um cenário de insatisfação popular provocado pela inflação e perda do poder aquisitivo.

– Embora não se fale nisso, é a perda do poder aquisitivo que explica, também, o apoio popular ao movimento. Mas, quando ocorrem abusos, a polícia tem de agir – defende.

O problema, na visão do ativista Lucas Fogaça, da Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre (Anel), é que os atos violentos, segundo ele pontuais, motivam ações ainda mais agressivas das autoridades.

– Quando há algum excesso, a reação da polícia é desproporcional. Por isso, a partir de agora as lutas devem adotar um caráter mais amplo também contra a repressão – aposta.

Para a cientista e professora da UFRGS Céli Regina Pinto, a resposta para a escalada de violência deve ser buscada:

– Dizer que são vândalos não basta. Não estou defendendo, apenas dizendo que precisamos saber quem são, porque essa violência é muito perigosa.


Paulista veio documentar a passeata no RS

Entre os manifestantes foram reconhecidos integrantes de torcidas organizadas da dupla Gre-Nal, estudantes e jovens com passagens pela polícia. Segundo registros policiais, dos 23 detidos, 14 moram em Porto Alegre e os outros vivem na Região Metropolitana. A maioria se declarou universitário ou secundarista e não possui histórico de envolvimento em atos de violência.

Um dos presos é o paulista Felipe de Aquino Ramos, 24 anos. Afirmou ser documentarista e que veio de São Paulo com o objetivo de fotografar os protestos. Um chip com imagens registradas por Ramos foi apreendido pela BM.

O estudante Fabrizio Dall Bello Arriens, 28 anos, responde a um Termo Circunstanciado (TC) por desobediência nos protestos para evitar cortes de árvores no entorno da Usina do Gasômetro, na Capital.

Um outro jovem, Jonathan da Silva Leite, 22 anos, já foi indiciado pela Polícia Civil por roubo e, em novembro do ano passado, preso em flagrante sob suspeita de tráfico de drogas, na zona norte da Capital.


Ordem era intervir em último caso

Como o protesto da quinta-feira à noite estava agendado em redes sociais, a Brigada Militar (BM) se precaveu escalando o maior número de PMs para acompanhar a manifestação. Cerca de uma hora antes do início da passeata, o Comando de Policiamento da Capital (CPC) deslocou cerca de 160 policiais de pelotões especiais para o centro de Porto Alegre.

A ordem era monitorar e intervir em último caso. A BM não admite, mas queria evitar confronto. Infiltrou soldados entre os manifestantes para descobrir eventuais alvos dos protestos, tentando se antecipar a depredações. De certo modo, a tática funcionou. Quando a marcha chegou em frente ao prédio do Tribunal de Justiça do Estado (TJ), o local já estava cercado de PMs. A parada diante do TJ teria o objetivo de pressionar a Justiça a reduzir a tarifa. Pedras foram arremessadas com estilingue em direção ao prédio, sem danos.

Mas em outros pontos do Centro, estabelecimentos não foram poupados. Mas por que foi permitido?

– A nossa intenção foi evitar um confronto de grande escala, pois tu sabes como começa, mas não sabes como termina. Quando tu pinças uma pessoa no meio da multidão, estimulas as condições para que se estabeleça um conflito em grande escala – justificou o comandante interino do 9º Batalhão de Polícia Militar (9º BPM), André Luiz Córdova.

Segundo ele, a conduta dos PMs foi dentro de um padrão adotado em outras manifestações, e só ocorreram intervenções quando fugiu do controle.

– Não podemos criminalizar os movimentos sociais. Apenas um pequeno grupo, que não chegaria a 2% do total de manifestantes, foi responsável pelas depredações – afirmou o delegado Antônio Vicente Nunes, do Departamento de Polícia Metropolitana.

Algumas das pessoas foram encurraladas em um bar na Praça Garibaldi, onde tentaram se refugiar. O grupo foi identificado pela BM, e a partir de provas como testemunhos e imagens, a Polícia Civil irá apurar os autores dos atos de vandalismo.

– Não houve uma clareza suficiente que nos permitisse fazer os autos de prisão em flagrante e individualização das condutas – afirmou o delegado.

Grupo RBS registra ocorrência por ameaça e carro depredado

O Grupo RBS registrou ocorrência na 2ª Delegacia da Polícia Civil pela ameaça a seus profissionais e depredação de um dos carro da empresa durante o protesto de quinta-feira na Capital. Na ocasião, um carro que levava funcionários para o Aeroporto Salgado Filho foi parado por manifestantes na Avenida João Pessoa, sacudido, pichado, chutado e teve o vidro traseiro quebrado por um pedaço de ferro.

Marcelo Rech, diretor-executivo de Jornalismo da RBS e vice-presidente do Fórum Mundial de Editores, lamentou a agressão aos profissionais da empresa, considerando-a uma tentativa de tolher a liberdade de imprensa e a livre expressão. Ricardo Pedreira, diretor-executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), também condenou o ataque e disse ser “inaceitável” tal ameaça.

A Associação Internacional de Radiodifusão (AIR) repudiou os atos de violência contra o Grupo RBS. Em nota, disse que violência, intimidação, ameaça e destruição material “violam os direitos fundamentais” e restringem severamente a liberdade de expressão”. Também frisou que “é dever dos Estados prevenir e investigar” os fatos, bem como “punir os responsáveis”.

Já a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) afirmou, em nota, que “atos de extrema violência e intimidação como o ocorrido na capital gaúcha são um grave atentado ao livre exercício do jornalismo e devem ser rechaçados”.

Mídia internacional relaciona fatos à Copa


A ação de policiais contra manifestantes em São Paulo recebeu atenção da mídia internacional. Nos Estados Unidos, a rede de TV CNN afirmou que houve “confrontos violentos exatamente um ano antes do início da Copa do Mundo”. Na França, a agência de notícias AFP disse que a confusão aconteceu “a três dias da abertura da Copa das Confederações”. O espanhol El País observou que a polícia paulista “perdeu o controle”. No argentino Clarín, o título destaca a continuidade do movimento. Já o venezuelano El Universal estampou uma foto em que um policial aparece atirando contra uma multidão.


OS ESTRAGOS: Fonte: Fonte: Brigada Militar

PICHAÇÕES - 21 lojas, um prédio, três bancas de revista e veículos

DEPREDAÇÕES - Seis agências bancárias, cinco veículos e um parquímetro

CONTÊINERES - Cerca de 40 contêineres foram virados, chutados e pichados, e um deles, queimado, provocando o bloqueio da Avenida João Pessoa por uma hora



Uma polícia violenta

No dia seguinte aos protestos marcados por violência, o governo de São Paulo abriu investigação para apurar excessos cometidos pela polícia nos protestos ligados às tarifas de ônibus. Apesar de reconhecerem a liberdade de expressão e se mostrarem abertos ao diálogo, as autoridades defenderam, nos discursos, a atuação policial.

Em São Paulo, a Secretaria da Segurança Pública garantiu que vai investigar supostos abusos. O prefeito Fernando Haddad (PT) descartou adiar o reajuste da tarifa para cessar as manifestações. Ontem, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) defendeu a mesma medida.

Para tentar acalmar os ânimos, Haddad decidiu convidar integrantes do Movimento Passe Livre, que tem organizado a onda de protestos, para uma reunião na terça-feira. A ideia é discutir de propostas sobre transporte público.

O prefeito ressalta, no entanto, que o convite não significa intenção de reduzir a tarifa reajustada recentemente, de R$ 3 para R$ 3,20. Haddad reiterou que o reajuste ficou abaixo da inflação e que cumpriu compromisso de campanha.

Já o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, considerou que houve “excesso” e “abuso” por parte de alguns policiais em São Paulo, mas elogiou a abertura de investigações e pontuou que o governo federal não intervirá porque o tema é de competência estadual.

No Rio, policiais também entraram em conflito com moradores. O governador Sérgio Cabral (PMDB) disse que há viés político no ato:

– Os jovens que foram presos pela baderna não estavam ali para defender interesses públicos, mas para gerar um clima de confusão.


EXCESSOS NA INTERNET - Manifestantes denunciam atuação policial

- Canais na internet foram criados por participantes dos protestos para divulgar o que consideram excessos policiais em SP. Os tumblrs oquenaosainatv.tumblr.com e o feridosnoprotestosp.tumblr.com, por exemplo, foram criados especialmente para denunciar agressões.

- Outro endereço, que usa a hashtag “protestosp” no topo, segue a mesma proposta. Há depoimentos de ameaças de policiais militares a cidadãos e relatos de que armas foram apontadas aos manifestantes – desarmados.




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