A mobilização social é um vigoroso instrumento de defesa de direitos e poderoso para pressionar os Poderes no exercício de seus deveres, obrigações, finalidade pública, observância da supremacia do interesse público, zelo dos recursos públicos e gestão voltada à qualidade de vida do povo. Não existe um futuro promissor para uma nação de cidadãos servis e acomodados que entrega o poder aos legisladores permissivos, a uma justiça leniente e aos governantes negligentes, perdulários e ambiciosos que cobram impostos abusivos, desperdiçam dinheiro público, sonegam saúde, submetem a educação, estimulam a violência, tratam o povo com descaso e favorecem a impunidade dos criminosos.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

NO RIO FOI A HORA DO "V" DE VINAGRE


ZERO HORA. 21 de junho de 2013 | N° 17468


Calculado em cerca de 300 mil pessoas, o protesto que partiu pacífico da Igreja da Candelária virou confronto em frente à prefeitura do Rio de Janeiro. A Avenida Presidente Vargas, que corta o Centro, virou um rastro de destruição com paradas de ônibus quebradas, radares de trânsito derrubados e fachadas de estabelecimentos depredados. Pelo menos 41 pessoas feridas deram entrada no Hospital Souza Aguiar. Bombas de efeito moral foram jogadas contra os manifestantes, que lançaram fogos e pedras. Houve correria e saques em lojas. No mínimo cinco pessoas foram detidas. Blindados foram usados para tentar restabelecer a ordem.

A suspeita era de que uma briga entre manifestantes em frente à cavalaria da PM gerou a confusão. Os cavalos teriam se assustado e os policiais partiram para cima. Os que protestavam revidaram. Antes mesmo da passeata, era difícil manter o equilíbrio.

“Sem partido! Sem partido!”, gritaram milhares de manifestantes na Praça da Candelária, quando militantes da CUT se aproximaram pela Avenida Presidente Vargas tremulando duas grandes bandeiras vermelhas da entidade.

“Sem partido! Sem partido!” Quem gritava eram jovens, possivelmente estudantes na faixa entre 16 e 26 anos. Eram muitos e pareciam hostis. Cercaram os militantes da CUT, que não passavam de um punhado.

“Sem partido! Sem partido!”, e um dos militantes baixou a bandeira. Os manifestantes aplaudiram. Outro teimou em manter a sua no alto, mas, em um segundo, viu-se sem nada nas mãos. Os manifestantes tomaram as bandeiras, panfletos e faixas da CUT, rasgaram tudo e, enquanto rasgavam, repetiam: “Sem partido! Sem partido!”

Houve tentativa de agressão a dois dos militantes da CUT, três ou quatro rapazes chutaram a parede de metal de uma banca de revistas fechada, mas logo outros manifestantes gritaram:

“Sem violência! Sem violência!”

E tudo se acalmou outra vez.

Manter esse equilíbrio era uma façanha de vontade coletiva. Desde o começo da tarde, a excitação era perceptível no ar do centro do Rio. Nas ruelas históricas perto da bela Igreja da Candelária, só o que se falava era na passeata marcada para as 17h. Na Presidente Vargas, os escritórios estavam fechados. Às 14h30min, a avenida tinha trânsito de dia de feriado.

Na esquina da Rua da Quitanda com Rosário, meninos e meninas mal saídos da adolescência pintavam o rosto de verde e amarelo e escreviam frases de protesto em cartazes espalhados pelo chão. Na Travessa do Ouvidor, onde Machado de Assis passeava e onde Olavo Bilac se inspirava para traçar um poema, o comércio fechava as portas nervosamente. Funcionários seguiam a passos rápidos na direção contrária da manifestação, em busca de condução para casa. Às 16h, não havia quase mais nenhum bar, restaurante ou lancheria abertos nas imediações.

Ambulantes tentam faturar com revolta

Mas, no coração da massa, os espertos ambulantes cariocas faturavam com a revolta popular. Havia vendedores de água mineral, refrigerante e cerveja, vendedores de tinta verde e amarela, vendedores de bandeiras do Brasil e, os que mais lucraram, vendedores de máscaras do filme V de Vingança – R$ 10 cada.

– É a máscara do três vê – anunciavam: – vinagre, vingança e vitória pra você!

O primeiro V estava lá porque os cariocas aprenderam que, contra gás lacrimogêneo, o melhor é enterrar o rosto na camisa molhada com vinagre. Assim, improváveis vendedores de sachê de vinagre também tiveram o seu quinhão.

A marcha saiu da Candelária às 17h, quase pontualmente. Os jovens iam caminhando com cartazes nas mãos; alguns, meras folhas de papel ofício. Não importava o formato, o que importava era a mensagem: pela saúde, pela educação, pela tarifa zero no transporte, pelo fim da corrupção e, também, pelo impeachment de Dilma, pela redução do índice do imposto de renda, contra o deputado Feliciano, a favor do amor homossexual, contra Sérgio Cabral, Pelé, Ronaldo Nazário, Renan Calheiros, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Havia ainda um rapazote carregando um cartaz em que se lia, tão somente, “basta!”, e um outro que defendia, muito sério: “Estado laico”.

Por volta das 18h, novos militantes da CUT e outros do PC do B e do MST vieram pela Presidente Vargas com suas bandeiras e faixas. E mais uma vez ouviram:

“Sem partido! Sem partido!”

Tiveram de recuar e guardar os estandartes. Restou apenas uma enorme bandeira, a maior de todas, mas ninguém se aborreceu com ela: era da Unidos de Vila Isabel.

Em torno das 18h30min, o primeiro grupo chegou às portas da prefeitura do Rio. Encontraram os PMs guardando o prédio montados a cavalo e munidos de bombas de gás. Era hora do V de vinagre.

*Com agências de notícias

DAVID COIMBRA* | ENVIADO ESPECIAL/RIO



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